segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Lira dos vinte anos de espera

(Parte 1)

Dormir e acordar não muda o que não vai mudar
Desatamos tudo que estava ao alcance de nós
Mas alguns não puderam ser desatados.

Dormir e acordar mais trezentas vezes
Alternando vozes e luzes
Muito pouco de nós em diferentes velocidades.

Estou com tristeza, estou sem tristeza
Agora eu deito tranqüila à noite esperando a manhã
Levar embora a sensação de que a minha vida não começou.

(Parte 2)

Ainda não chegou a aurora boreal
E eu que achava que por esta idade
Estaria já no auge da vida.

Mas que demora.
Ainda não rompeu a vida
Ainda não raiou a hora.

Livros, podem me dizer
Quando tudo se abrirá para mim?
Mas eles se fecham.

Música, quando tudo começa?
Mas ela se cala
Como todas as respostas.

E eu também me calo
Eu vivo em eterno ensaio
Para a vida que ainda não vivo
E não sei quando...
Eu sou um protótipo humano
Tentando virar o que eu sempre quis ser
E nunca fui.

Mas a gente se desaponta
É tão difícil estar em ambas as pontas
Poder e não poder
Tenho nas mãos, mas deixo escorrer
A flor que nunca desponta.

Minha vida só espera eu ficar pronta
O que me falta?
Não quero entrar desajeitada na vida
Assim, toda errada
Só de mim depende começar
A vida além do horizonte
O que me espera
Do outro lado da ponte?

O que eu espero?


(Parte 3)

Se eu pudesse olhar pra dentro
E enxergar minha alma
Eu veria um campo imenso na imensidão da noite
Extenso até onde os olhos não podem ver.

Eu andaria até o raiar do dia
Até me deparar com uma gota
Enorme, flutuando alguns metros sobre o chão
Uma gota feita de vidro.

Para dentro dela eu ficaria olhando
Como se olha peixes em um aquário, nadando:

As dores que eu já senti
Flutuando nas lágrimas que eu já chorei
Ao som das músicas que eu já ouvi.

Essa gota, um dia, há de cair
O vidro cristalino então vai se quebrar

Derramadas lágrimas vão escorrer
Molhando o campo, que vai florir
Milhões de cores a transbordar
Milhões de luzes que eu nunca vi.

Fora da água cada dor vai debater
Seu corpo escamoso até morrer.

A música que era sufocada vai se expandir
Virando um novo tipo de oxigênio no ar
Tão puro como eu nunca senti.

Quando isso tudo finalmente acontecer
Minha vida começará.


Jessica Ferreira


"It's my time to shine, like a tuna in the brine" (Tuna in the Brine - Silverchair)

"She's a tear that hangs inside my soul forever" (Lover, you should have come over - Jeff Buckley)

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