segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Lira dos vinte anos de espera

(Parte 1)

Dormir e acordar não muda o que não vai mudar
Desatamos tudo que estava ao alcance de nós
Mas alguns não puderam ser desatados.

Dormir e acordar mais trezentas vezes
Alternando vozes e luzes
Muito pouco de nós em diferentes velocidades.

Estou com tristeza, estou sem tristeza
Agora eu deito tranqüila à noite esperando a manhã
Levar embora a sensação de que a minha vida não começou.

(Parte 2)

Ainda não chegou a aurora boreal
E eu que achava que por esta idade
Estaria já no auge da vida.

Mas que demora.
Ainda não rompeu a vida
Ainda não raiou a hora.

Livros, podem me dizer
Quando tudo se abrirá para mim?
Mas eles se fecham.

Música, quando tudo começa?
Mas ela se cala
Como todas as respostas.

E eu também me calo
Eu vivo em eterno ensaio
Para a vida que ainda não vivo
E não sei quando...
Eu sou um protótipo humano
Tentando virar o que eu sempre quis ser
E nunca fui.

Mas a gente se desaponta
É tão difícil estar em ambas as pontas
Poder e não poder
Tenho nas mãos, mas deixo escorrer
A flor que nunca desponta.

Minha vida só espera eu ficar pronta
O que me falta?
Não quero entrar desajeitada na vida
Assim, toda errada
Só de mim depende começar
A vida além do horizonte
O que me espera
Do outro lado da ponte?

O que eu espero?


(Parte 3)

Se eu pudesse olhar pra dentro
E enxergar minha alma
Eu veria um campo imenso na imensidão da noite
Extenso até onde os olhos não podem ver.

Eu andaria até o raiar do dia
Até me deparar com uma gota
Enorme, flutuando alguns metros sobre o chão
Uma gota feita de vidro.

Para dentro dela eu ficaria olhando
Como se olha peixes em um aquário, nadando:

As dores que eu já senti
Flutuando nas lágrimas que eu já chorei
Ao som das músicas que eu já ouvi.

Essa gota, um dia, há de cair
O vidro cristalino então vai se quebrar

Derramadas lágrimas vão escorrer
Molhando o campo, que vai florir
Milhões de cores a transbordar
Milhões de luzes que eu nunca vi.

Fora da água cada dor vai debater
Seu corpo escamoso até morrer.

A música que era sufocada vai se expandir
Virando um novo tipo de oxigênio no ar
Tão puro como eu nunca senti.

Quando isso tudo finalmente acontecer
Minha vida começará.


Jessica Ferreira


"It's my time to shine, like a tuna in the brine" (Tuna in the Brine - Silverchair)

"She's a tear that hangs inside my soul forever" (Lover, you should have come over - Jeff Buckley)

terça-feira, 30 de novembro de 2010

A calma

Da janela do meu quarto
O mundo é tão pacato
A noite é tão imóvel
A lua cheia na piscina parece que flutua.

O vento que chega devagarinho no meu rosto
Nem parece vento...
Parece aquele pedaço de mim
Que eu perdi por aí
Querendo voltar.

Quase nenhum barulho
Parece que a noite mergulhou dentro de mim
E nadou até o fundo.

Seria tão bom se eu pudesse
Voar até aquela montanha e voltar
(Só pelo prazer de voar)

Fecho a janela em silêncio
Vou dormir e nem sequer desconfio
Do tumulto das formigas a trabalhar
Da agitação microscópica das moléculas no ar.

E a noite vai embora também
Sem desconfiar do tumulto dentro de mim.

Jessica Ferreira

sábado, 20 de novembro de 2010

Até logo

Como não sufocar de amor um anjo
Se o sorriso que se abre quando ele desperta,
Antes que a própria consciência esteja alerta,
Faz meu coração de amor transbordar?

Como não se cativar
Com a sua timidez na mesa de jantar
Enquanto os seus olhos grudados no próprio prato
Só se levantam para escavar as memórias secretas
No espaço suspenso no ar
Sem reação na superfície discreta
Que só o encontro com os meus pode catalisar?

Sobrou só o perfume no meu travesseiro
E as mãos que não pretendo lavar
E Deus, tão grande e extenso
Voltou já entre nós a sentar
Sobraram só nossas mãos através da janela
Até que cada roda começasse a rodar
Sobrou só o perfume no meu travesseiro
É tão forte o perfume
Como não sufocar?

Jessica Ferreira

Fraqueza da gravidade

Chão, velho amigo
Melhor amigo do homem
Não nega seu colo a ninguém
Não cura frio, solidão nem fome
Mas na solidez construiu seu nome
Mais firme que o firmamento
Ele está sempre lá...

Cá estamos nós de novo
Te deram uma rasteira?
Dessa vez puxei meu próprio tapete
Estou cansado de me sabotar

Chão amigo, estou querendo levantar
Mas há um ladrilho fora do lugar
Aposto que é nesse que eu vou tropeçar

Chão, você é duro demais comigo
Mas você tem sido um bom amigo
Sempre que escorrego, me esfrego, me entrego
Voce acolhe este irmão caído.

Por que você continua aqui?
Chão imundo, sujo, te xingo
Te esmurro, quero te abandonar
Por que você me perdoa se tanto eu te piso?
Por que você me deixa voltar?

Tão cansado de me sabotar...
Tão cansado...
Tão...

Jessica Ferreira

Hermes, interrompido

Meu pé da frente tem uma asa
Mas o pé atrás não me deixa voar.
Tem raiz o pé atrás
Mais profunda que a do baobá.

O pé da frente acredita no vôo
Mas o pé atrás, sempre a desconfiar
Pé direito não voa, diz o pé gauche
Onde já se viu pé por aí voar.

Pé atrás, experiente e calejado
Pé no chão, muito sensato.
Pobre do seu irmão alado
Proibido de sonhar...

(Acabo eu rasgado ao meio)

~~Jessica Ferreira ~~

Pela estrada

Eu vi você sozinha e decidi te acompanhar
Menina bonita e perdida
Ansiosa por viver, cansada de sonhar
Não sabia de você, da sua vida
Menina calada, esquecida
Mas fiquei tão feliz de te achar...
Quero saber aonde vamos
Mas você não tem mais planos
Tão cansada de sonhar...
Então me conformo em ir andando
Ao seu lado, sem duvidar
Tudo que eu sei sobre você
É que eu quero te acompanhar
Não sei de mais nada agora
Te entreguei os meus passos
E nossas mãos são um laço
Virei eu o perdido, o esquecido
Te dei a certeza do meu caminhar
E agora não sou mais um homem
Sou duas pernas e uma vontade de chegar.

Jessica Ferreira

A um (outro) ausente

Estou tão longe e a saudade é tanta
Ficou maior que a distância
Ficou maior que a saudade
Ficou maior que a estrada
que une as duas cidades.
Distância, espaço, tamanho, tudo fica pequenino
Perto dessa coisa que cresce em nós, essa falta
Falta para defini-la a palavra.
Ela invade, a saudade
Invade essa solidão (é essa?) de todas as tardes
E não há remédio genérico que me deixe curada
Dessa carência (o livro de auto-ajuda diz que não pode sentir)
Livro no Brasil anda caro...
Já perdi o fio da meada
E ainda não achei a palavra
Lonjura? Não sei se está no dicionário
E estou com preguiça de levantar...
Falteza? Falta-lhe a boniteza
(A norma culta sente saudade?)
Eu detestei a reforma ortográfica
Achei uma péssima ideia (se fosse idéia seria genial)
Pronto, o poema está louco!
Não tem mais movimento de significação
Não tem tema (agora também não tem mais trema)
Sobre o que fala o raio do poema?
Falava de saudade...
Mas o poema foi embora
E agora estou com saudade dele também.

Jessica Ferreira

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

No fundo

Não estou sabendo existir no mundo
estou existindo só dentro de mim,
preocupada com a eternidade que possa resultar de cada segundo
E o momento se perde de mim, se perde no mundo
perdido o primeiro momento, perdido o segundo...

E o pensamento se perde, o pensamento nulo
Não se transforma em nada, escondido em seu casulo
Mas que será que pensa o mundo?
Será que o mundo pensa em mim?
Sou eu o pensamento que o inunda
Em dias de maré alta

Vazia de respostas, cheia de perguntas,
Nos dias em que vêm à tona as águas profundas,
Respingando loucamente enquanto gira o mundo,
Lágrimas do esforço de tentar acompanhar o mundo?

E eu agora me pergunto
O que será que existe no fundo de tudo
No fundo de mim, no fundo do mundo?

Talvez a eternidade esquecida
Talvez os segundos de vida
Quis todos
E acabei sem nenhum.


Jessica Ferreira



Ég Lek Jafnvægi - Balance leaks out
Ég Dett Niður - I fall down
Ég Læt Mig Líða Áfram - Slide forward
Í Gegnum Hausinn - Through my head
Ég Kem Alltaf Niður Aftur Á Sama Stað - I always return to the same place
Alger Þögn - Total silence
Ekkert Svar - No answer
(En) Það Besta Sem Guð Hefur Skapað - But the best thing God has created
Er Nýr Dagur - Is a new day.

(Viðrar Vel Til Loftárása - Sigur Ros)

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Drummond do mundo

Você encaixado no mundo seria um desgaste
Veja o mundo ao redor, veja o contraste
Entre a sua pele macia e a dureza das ruas
Entre o céu cinzento e as pupilas suas
Tão dilatadas nesse mundo escuro
Nesse riso escuro a rir do seu instinto puro.

Não se mescle com o mundo
Não permita que ele deixe

Seu olhar cada vez mais fundo
Nem sua pele descascada do descaso
Não deixe que o seu destino morra por acaso

O mundo quer diluir no esgoto as suas lágrimas cristalinas
Quer ver seus encontros se perderem pelas esquinas
O mundo inveja da sua bondade a face corada
Inveja o rodopio colorido das suas manhãs, tardes, noites, madrugadas
Misturadas num suspiro de cores roxas, rosas, amarelas, azuladas
Mas o mundo não tem nada disso, o mundo não tem nada
O mundo é cinza de manhã de noite cinza de tarde cinza madrugada desbotada
Não sabe abrir um sorriso do jeito que você abre
Aposto que nem rodopiar sabe...

O mundo só quer engolir mais um, sem fome, sem vontade, sem compaixão
Engolir um por um por pura compulsão
Na massa cada dia mais cinzenta da sua opressiva razão.

Seja a flor no concreto do mundo
Seja Raimundo, seja a solução.
Seja o "meu Deus" e o "meu amor" do mundo
Seja o anti-absolutismo da depuração
Seja um pouco de amor, seja um pouco Drummond
No meio do caminho tinha um coração.


Jessica Ferreira

terça-feira, 24 de agosto de 2010

O despertar da Aurora

O amor adormecido
Desperta
Ainda entra o vento
pela porta, ainda aberta.
Voltou por linhas tortas
Na hora certa.

O amor adormecido
Quase foi esquecido
Mas não se esqueceu
Guardou o mesmo lugar
No coração que já havia sido meu.

O amor adormecido
Ainda se lembra
Do cheiro que continua o mesmo
Mesmo sendo já outro perfume
Ainda se lembra do mesmo ciúme
(Mas era melhor não lembrar...)

O amor adormecido
Não perdeu o jeito de amar
E o próprio amor não se perdeu
É como andar de bicicleta
(E ele ainda não aprendeu...)

O amor adormecido
Que volta, decidido
Com uma lágrima a mais de presente da vida
O sorriso que foi sempre tão bonito
E os olhos tristes que eu não tinha percebido.

Jessica Ferreira

domingo, 15 de agosto de 2010

Vonlenska

Eu sou o cheiro da madrugada que você não entende
Eu sou o vento entre os seus dedos que a sua mão não prende
Eu sou a linguagem oculta da esperança
Que a sua razão tenta decifrar mas nunca aprende
Eu sou a verdade que dói, mas não mente
Eu sou a espera insistente
O lugar que você acha que já visitou na sua mente
A magia que você não precisa entender para amar
O incompreensível e oculto linguajar
Que se comunica pela beleza singela
Da voz misteriosa e de tão estranha, bela
Cantando o amor contra a corrente
Eu sou o que você sente
Eu sou a voz da luz que você tanto procura
E finalmente se acende.

Jessica Ferreira

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Ara Bátur

A música é boa quando ela vai expandindo
E faz o meu espírito também expandir,
Até ele não caber mais no meu corpo,
Atingir o tamanho do universo e então explodir
Explodir junto da explosão da música,
E o espírito na música se fundir
E espírito e música virarem a mesma chuva
A transbordar nos lábios de um não se conter e cantar
A transbordar nos olhos de um não se conter e chorar...
A música, mesmo triste, é um choro de felicidade
O arrepio e a lágrima descem na mesma velocidade
E quando a música acaba, fica tudo em suspense
Fica música em mim, tocando em silêncio

Jessica Ferreira


Ara Bátur - Sigur Rós

Þú reyndir allt
Já, þúsundfalt
Upplifðir nóg
Komin með nóg
En það varst þú sem allt
Lést í hjarta mér
Og það varst þú sem andann aftur
Kveiktir inní mér

Ég fór, þú fórst

Þú rótar í
Tilfinningum
Í hrærivél
Allt úti um allt
En það varst þú sem alltaf varst
Til staðar fyrir mann
Og það varst þú sem aldrei dæmdir
Sannur vinur manns

Ég fór, þú fórst
(hopelandic)

Þú siglir á fljótum
Yfir á gömlum ára
Sem skítlekur
Þú syndir að landi
Ýtir frá öldugangi
Ekkert vinnur á
Þú flýtur á sjónum
Sefur á yfirborði
Ljós í þokunni

(hopelandic)


Tradução em inglês:

Row Boat

You tried everything
Yes, a thousand times
Experienced enough
Been through enough
But you it was who let everything
Into my heart
and you it was who once again
Awoke my spirit

I parted, you parted

You stir up
Emotions
In a blender
Everything in disarray
But it was you who was always
There for me
It was you who never judged
My true friend

I parted, you parted
(hopelandic)

You sail on rivers
With an old oar
Leaking badly
You swim to shore
Pushed the waves away
But to no avail
You float on the sea
Sleep on the surface
Light through the fog

(hopelandic)

Tropikos (uma volta completa)

Entre nós dois passeia o Sol

Trópico de Câncer
Calmo, quieto, sorriso manso
Seu corpo é mais quente que o normal
Aquece o mundo com seus abraços
Amante latino tropical

Linha do Equador (cada vez mais tênue)

Trópico de Capricórnio
Falante, inquieta, risada aberta
Seu coração é mais quente que o normal
Estremece o mundo com seus suspiros
Romântica sensível sensual

Entre nós dois passeia o Sol

(...)

(A distância
Entre os trópicos
Vai-se dissipando
Com o calor
Evaporando
Até sumir
Por enquanto
São paralelos
Mas muito em breve
Vão convergir)


Jessica Ferreira

sábado, 7 de agosto de 2010

"Wait in the fire"

Eu vejo a felicidade vindo pra mim
Olha ela ali, vindo de longe
Ela quer vir para mim, ela está tentando
Já traçou seu caminho, e eu estou esperando.

Posso enxergar a luz que ela irradia
(mesmo quando a noite escurece o dia)
Mas ainda vejo só um ponto, só um pouco
Espero em breve poder deixar meus olhos
engolirem toda a luz, como "diamantes loucos".

Eu estou presa onde estou
Não posso ir ao encontro dela
Nada posso fazer por ela
Só me resta esperar que ela chegue
Só me resta torcer por ela
Todo dia sonho que ela já chegou
Em sonho posso senti-la por perto
Me orgulho por vê-la tentando, desafiando o incerto
Minha vida agora é ficar esperando...e eu espero.

Sinto que estou "esperando no fogo"
Quando sinto medo de ela nunca chegar
Sinto medo de chorar de novo...
Espero com o coração queimando
Com medo de ficar para sempre só
Esperando...
Tenho medo de ela não chegar...
Mas ela está tentando
E enquanto ela tentar
Eu vou ficar esperando.

Já tenho uma centelha da felicidade
Só por ela estar vindo
E mesmo de longe eu consigo ver
Que enquanto ela vem, ela está sorrindo...
Olha o sorriso dela pra mim, que lindo...

A espera é longa
Mas a nossa história de amor é antiga
Tenha força, felicidade, siga!
Vou te esperar até que você consiga.
Não vou desistir de você, eu te espero
Ei...felicidade...eu te quero.

Jessica Ferreira

"Threatened by shadows at night,
And exposed to the light.
Shine on you crazy diamond. (...)
Nobody knows where you are,
How near or how far.
Shine on you crazy diamond.
Pile on many more layers and
I'll be joining you there.
Shine on you crazy diamond."
(Shine on you crazy diamond - Pink Floyd)

"My fading voice sings of love
But she cries to the clicking of time
Of time...
Wait in the fire, wait in the fire
Wait in the fire, wait in the fire..."
(Grace - Jeff Buckley)


"So I'll wait for you, and I'll burn
Will I ever see your sweet return?"
(Lover, you should have come over - Jeff Buckley)

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Eu no país das consciências

O vento que entra pela janela do meu quarto de madrugada é diferente do vento que entra por qualquer outro canto da casa.
Acho que é porque ele traz um cheiro que mais nada na vida me traz, cheiro de quê?
Perguntei à minha mãe por que ele era tão bom e ela me disse que era o cheiro da vida...
Não entendi nada, mas é o mesmo cheiro que eu sinto de madrugada quando imagino um campo cheio de margaridas
E vejo uma menina sentada que às vezes eu acho que sou eu, às vezes eu acho que é a minha consciência...
Eu sei que ela saberia me responder exatamente o que de especial tem o vento-do-quarto-de-madrugada que não tem o vento-do-meio-dia-do-ônibus nem outro vento do mundo.
Claro que ela sabe, afinal ela é minha consciência e enxerga as palavras que eu não enxergo para as coisas que não sei explicar. Certo?
Certo. Vou atravessar esse campo amarelo e perguntar para ela, e vou entender finalmente o vento místico da madrugada. Olha lá a minha consciência sentada bonitinha, ela parece comigo e ela está rindo...Mas o riso dela é mais bonito e o cabelo dela brilha mais com o sol...Minha consciência sou eu, só que aprimorada.
Mas assim que chego perto dela, esqueço dessa ventania toda e acho por bem perguntar sobre coisas mais concretas e urgentes: o que eu faço em relação ao problema tal da minha vida? Ai, larga essa margarida logo e me responde...o que eu faço? Pára de rir logo, menina, me ajuda, eu tô com uma questão amorosa pendente, que caminho eu tomo?
Mas a minha consciência não fala, principalmente quando ela precisa falar. E agora eu preciso da minha consciência e ela não fala. Fala, desgraçada! Fala, infeliz! Não fala.
Aposto que se eu decidisse perguntar pra ela sobre a longínqua questão etérea do vento ela me responderia, ah, responderia sim. Mas eu decidi perguntar outra coisa. Perguntei uma coisa prática demais, e poética de menos, para que uma criatura tão subjetiva pudesse responder.
A gente percebe quando a poesia acaba assim, de repente...a vida real entra no meio e desmancha o campo florido de margaridas e o vento místico da madrugada...quando a gente precisa de respostas a poesia já não serve para nada.
E eu acordo com o meu cabelo de sempre e minha risada habitual e continuo sem saber explicar o vento e sem saber o que fazer da vida...


Jessica Ferreira

Vertigem

Ciclo, pare, deixe de ser ciclo
Pare, espere, eu não quero ir contigo
Pare, estou com medo, estou perdido
Quando eu disse que queria o infinito
Quis dizer caminho reto e comprido
E não a volta eterna ao começo desse ciclo
Nunca quis o retorno ao princípio
Nem de novo conjugar o particípio
Tenho medo desse eterno precipício
Ciclo, pare, deixe de ser ciclo
Pare, espere, eu não quero ir contigo
Pare, estou com medo, estou perdido...

Jessica Ferreira

A mais bela semente

Somente nos bosques da verdade
De mil cores e infinitas matizes
Se encontra a real felicidade
Que vive a nutrir as profundas raízes,
E talos, e troncos do amor
Com seus anéis de amor antigo,
E surge assim a singela flor
Regada por espíritos amigos,
Sempre embrenhados na floresta densa
Da verdade sincera e benevolente
E envolvidos pela certeza imensa
Do amor, a mais bela semente.

Jessica Ferreira

"Look at the stars, look how they shine for you"

Nós somos dois ramos do mesmo tronco
Pronto: cheguei a essa conclusão.
Nós temos o nome do mesmo santo
Nascemos do mesmo encanto
Pronunciado por um só anjo.
A mesma estrela isolada brilha pra nós dois na madrugada
Seu coração e o meu no mundo e mais nada.

Jessica Ferreira



Trecho de O Pequeno Príncipe:

"E tu terás estrelas como ninguém...
Quando olhares o céu de noite, porque habitarei uma delas, porque numa delas estarei rindo, então será como se todas as estrelas te rissem! E tu terás estrelas que sabem rir!
E quando te houveres consolado (a gente sempre se consola), tu te sentirás contente por me teres conhecido. Tu serás sempre meu amigo. Terás vontade de rir comigo. E abrirás às vezes a janela à toa, por gosto...E teus amigos ficarão espantados de ouvir-te rir olhando o céu. Tu explicarás então: 'Sim, as estrelas, elas sempre me fazem rir!'
E eles te julgarão maluco. Será uma peça que te prego..."


"Look at the stars
Look how they shine for you
And everything you do
Yeah, they were all yellow"
(Yellow - Coldplay)

Vinho de amor antigo

Misturei meu coração no vinho
E te dei para beber
O vinho de amor era tão concentrado
Que te deixou logo embriagado
Tanto mais entorpecido
Quanto mais envelhecido
De anos esse amor guardado.

Jessica Ferreira


"I made wine from the lilac tree
Put my heart in its recipe
It makes me see what I want to see
And bee what I want to be
When I think more than I want to think
I do things I never should do
I drink much more than I ought to drink
Because it brings me back you

Lilac wine is sweet and heady
Like my love
Lilac wine, I feel unsteady
Like my love...
Listen to me, I cannot see clearly
Isn't that she coming to me, nearly here?"
(Lilac wine - Jeff Buckley)

Tentando me encaixar no mundo

Tenho ficado horas exposta à neve gelada
Para dissipar o calor e evitar
Chocar-me com o gelo do mundo.
Nada mais derrete essa solidez de pedra
Que aprendi a ter vivendo entre pedras
E entre pedras vou me encaixando no mundo.
Conchas mostram seu brilho inocente e sofrem
Sem saber que os humanos só podem
Respeitar a dureza da concha.
Perdi a umidade da carne, parei de ter sede
Toda água do mundo é ilusão de umidade
Toda beleza do mundo é ilusão de verdade.
E assim vou me encaixando no mundo
Quanto mais fico igual entre iguais
Mais o mundo me acolhe, semelhante.
Os olhos feios do mundo espelham a minha feiúra de alma
Matei o mundo bonito que eu tinha em mim
Matei a golpes de realidade.


Jessica Ferreira

You're my favourite smile

Bet your favourite dime
And waste your luck
At this very moment, as we're speaking
The night is melting into your soul

Love, you showed me the magic
Please don't regret that night
You lifted me up
Like moon lifts the tide

Love, I'm on my way
Love, through the years I'll have your smile in my heart
Keep staring at the sky
Because when the night falls, I'll knock on your door.


Jessica Ferreira

Luz, dê-me uma voz

Luz, você tem voz?
Porque eu preciso ouvi-la agora
Preciso ouvi-la sem demora
Luz, o que eu faço? Eu ouço mil vozes
Mas todas elas são vozes da terra
Uma ou outra sussura, uma ou outra berra
Mas nenhuma me conduz, porque nenhuma vê a luz
Porque nenhuma é a luz, e eu não sei qual é a certa
Eu preciso da voz da luz pra clarear esse barulho
Pra me apontar o silêncio que eu tanto procuro,
O silêncio do meu farol que brilha sozinho no escuro.
Luz, fale comigo com a sua voz
Brilhe bem alto com uma nota certeira
Que ultrapasse todo o ruído turvo como sujeira
Luz, seja de todas a única voz verdadeira.


Jessica Ferreira


"You're my guiding lightning strike
I can't find the words to say
They're overdue...
I'd travel half the world to say
I belong to you..."
(I belong to you - Muse)

Breve poema de sonho

Era tarde era tarde
Era já o começo da tarde
Era um bosque, era enorme...
E o sol ardia como de tarde o sol arde
E os raios de sol por entre as árvores
Os raios antes do sol se pôr,
O sol entrava por entre as árvores
Iluminando nós dois, meu amor.
Eu de vestido claro e você me olhando
Você estava sorrindo, claro
Eu estava feliz, e corria
E ria pra você, e corria, e voltava
E os raios de sol e as folhas, e a gente se amava
Eu via as folhas caindo do céu, flutuando no ar
Eu voltava a correr e eu ria e voltava
E voltava correndo pra te abraçar
Era um sonho bonito o que você sonhou
Era o dia mais vivo que se pode sonhar
Era a voz te dizendo: - Fique tranqüilo
É com ela que você vai ficar
Era um sonho, é um sonho bonito
É um sonho...não quero acordar.


Jessica Ferreira


"Foi você o sonho bonito que eu sonhei
Foi você, eu lembro tão bem, você
Na minha visão
E me fez sentir
Que o meu amor nasceu então
E aqui está, você, somente você
Na minha visão
Aquela do sonho que eu sonhei..."
(A Bela Adormecida)

Poesia da madrugada inquieta

Coração quente
Cabeça fria (tentando)
Corpo descontente
Falhando...
Como equilibrar os conflitos da natureza minha?
Descobri em mim esperanças
que eu nem sabia que eu tinha...

Qual dos meus medos triunfará dessa vez? São tantos
Já pedi duzentas vezes para dois mil santos
Que os meus medos lutem entre si num combate,
Numa luta que não pode nunca terminar em empate
E que, medo por medo mutuamente aniquilado
Sobrem somente mil coragens lado a lado.

Falar é fácil:
-Seja fria, desapegue
Ame pouco, não se entregue
O tempo voa e a vida segue
Não deixe que o amor te cegue.
Falar é fácil.

Ouçam o choro de um coração cansado
Que se agarra a uma chance de ser amado
Vejam como ele está apertado, parado
Sem ousar seguir, sem saber pra que lado...

Jessica Ferreira



"A coragem do primeiro pássaro

No final das contas, somos todos sobreviventes de nós mesmos
Lá nas prisões do finito, ousar ser eterno: amor como atalho e labirinto
Mas se você não está morto, sonhará porto por perto
Anoiteça o que anoitecer, coração aberto."
(André Dahmer)

Espelhinhos de Ojesed

Olhos tão tristes e um sorriso tão bonito
Moram no mesmo rosto
Têm o gosto do mesmo gosto
Que eu carrego na minha boca.

A doçura dos seus olhos tristes
E o calor dos vincos do seu sorriso
Aquecem e adoçam meu coração.
Nesse relance mágico perde o sentido
Qualquer motivo pelo qual me esquivo.
Com um sorriso adocicado por olhinhos de criança
Sinto derreter essa frieza que tanto me cansa
Frieza que eu tanto tentei forjar em mim.

Se os meus medos por você de lado eu pus
Espero que seu espírito seja feito só de luz
Assim como em seus olhos o meu gelo se desfaz
Assim como é luz o seu sorriso, luz perfeita e nada mais
Nada além do puro amor que só o seu rostinho me traz.

Espero que esses olhos sejam de verdade...
E que depois de anos a verdade de hoje ainda seja verdade.
Espero ver ruga após ruga nascer nesses olhinhos
E vincos e mais vincos abraçarem seu sorriso
E que ainda assim os seus olhos continuem doces
E o seu sorriso ainda seja para mim.

Se a sua alma usar seus olhos e sorrisos como espelhos
Que os espelhos seus me mostrem nada além dos seus desejos
E que os seus desejos sejam de verdade, e que a verdade
Seja quente, doce e brilhante como o sol da nossa tarde
A mesma tarde daquele sonho que você sonhou comigo
Quente e brilhante como o seu rosto quando eu estou contigo.

Jessica Ferreira




"O Espelho de Ojesed (The Mirror of Erised) é um magnifíco espelho, que alcançando o teto, possui uma moldura dourada e fica apoiado sobre dois pés em forma de garra.
Há uma inscrição no topo do espelho que diz: "Oãça rocu esme ojesed osamo tso rueso ortso moãn",
que de trás pra frente quer dizer: 'Não mostro o seu rosto mas o desejo em seu coração'
(em inglês: 'Erised stra ehru oyt ube cafru oyt on wohsi" ou "I show not your face but your heart's desire').
Ao olhar para o espelho, a pessoa verá o desejo mais profundo, mais desesperado de seu coração"


(Retirado de: Ojesed.org - http://ojesed.org/Espelho_de_Ojesed)

Poesia dos diálogos incessantes

Qual é o dom intangível que eu preciso ter
e qual é a musa impossível que eu preciso ser
para ser amada?
Me explica de novo que eu preciso de pouco,
pouco além do que eu tenho,
pouco além deste empenho em amar de verdade.

Como eu posso na escuridão não ter o coração fechado
e não ser enganada?
No coração fechado a escuridão não entra disfarçada de luz,
mas também não entra nada.
Me ensina a abrir meu coração pela abertura certa, que passe a peça certa, que passe sem pressa, pra que só passe amor.
E depois que o amor entrar, que passe só o que é passageiro, mas que o amor não passe.
Pra que tudo se mostre claro e aberto, que não tenha um disfarce, que tudo se encaixe.
Pra que mesmo sem fala eu não perca o sentido, mas que cada fala possua um sentido
nascido onde todo sentido nasce.

Jessica Ferreira

A cor da liberdade

Nada sangra mais que a liberdade
Só o que é livre realmente sangra
Só o que é livre quebra a cara, se espanta
Somente sendo livre se desaponta.

Nada sangra mais que a liberdade
O que não é livre não sangra
Mas também nunca cicatriza
O que vive preso se estanca

Como o pensamento estanque
Como o coração sufocado
Nas veias de um corpo branco
Onde não corre o amor, nunca dado

O que não é livre não sangra
Vive atrás do seu muro, distante
do mundo lá fora, cortante,
bombeando sangue, constante.

Nada sangra mais que a palavra,
Depois de mil tinteiros quebrados,
Escrita com o sangue que escorre
De um coração esmagado.


Jessica Ferreira